terça-feira, 24 de abril de 2012

Virada

Cansado da correria, dos congestionamentos e da concorrência insuportável entre os humanos da capital, foi para o interior. Tão interior que se chamava Distrito alguma coisa. Comprou um chalé de madeira e começou uma vida simples.

Ia à feirinha da comunidade, e observando as crianças que ali trabalhavam, que não sabiam fazer conta direito, nem sabiam quem era Machado de Assis, preocupou-se com o futuro delas. Que seria daquelas figurinhas? Continuariam a vida dos pais, ignorantes, na roça.

Resolveu abrir uma pequena biblioteca em casa. Dava aulas complementares de assuntos gerais como voluntário na escola local. Via-os como pobres criaturas, privadas do conhecimento e acesso às facilidades modernas. Se não houvesse investimento e esforço, não teriam chance.

Num desses dias, quando instava os bichinhos a estudarem mais pra que pudessem finalmente "mudar a história da família", foi pego de chofre por uma pergunta: "Por que o senhor veio morar aqui?"

Fechou a biblioteca. Parou com as aulas. Foi visitar seu vizinho e ver se aprendia a lidar com a horta desleixada que mantinha no quintal.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Quem sabe...

Abro o forno. Tiro de lá um bolinho de laranja delicioso, de uma laranja especial. Ela está mais amarelinha, mais cheirosa e saborosa do que nunca. Coloco na janela. A cortina balança com um ventinho gostoso, que traz cheiro de mata, de flor, de sol.
Olho pra fora. Meu jardim está em festa. As flores parecem antecipar o que vem. Meu banco amarelo pede companhia. Minhas unhas tem resquício de massa, minha roupa denuncia que andei cavocando por aí.
Todo o ar canta. Tudo está assim, dançando ao vento e ao som da cachoeira que corre lá ao fundo.
Talvez ele venha hoje. Capricho no café. Será que vai preferir mate? Talvez chá... a erva-doce do jardim se balança como quem diz "Me escolhe!".
Não há dor nem correr. Não há medo nem pesar. Só um intenso preparar. Ele está sempre chegando, sempre presente, rodeando meu pensamento e minhas ações. Faço tudo pensando nele.
Arrumo a cama, varro o chão, canto e cozinho na expectativa. Faço tudo pra que Ele se sinta o melhor, o mais especial, meu escolhido desde todas as eras.
Limpo o banco do jardim. Amarelo, como ele gosta. Aliás, me deu uma mão maravilhosa, e serrou todas as madeiras desse banco. Lixamos, pintamos e montamos juntos, fizemos a maior sujeira, dando gargalhadas e contando as últimas que andavam acontecendo por aí. Sentei perto do torno e da serra, só pra sentir o cheiro da madeira que se deixava cortar, feliz e exalante, porque a causa era nobre. Não há carpinteiro igual nos arredores. O corte dele parece não doer, só transformar.
Ele me conta histórias de tempos que não acho que vivi, de dores que não sei se senti, de reencontros. Parece um filme, onde eu atuo, mas perdido numa vaga lembrança. Fico qual criança, que nem pisca, que se delicia. Ele toma meu café, às vezes um mate, às vezes um chá. E elogia meu bolo. Ah, se elogia! Dia desses até pediu a receita. Como se não soubesse...
Daí vamos para a cachoeira. Acho tão engraçado... o barulho da água correndo nas pedras parece sair da boca dele. Ele tem uma voz linda, ora de mar, ora de rio, ora de chuva.
O dia termina. Ou eu acho que termina. Nunca sei. Só sei que ele me dá um beijo de boa noite (ou será bom dia?). Nunca sei... só sei que em meus sonhos ele está, ajeita minhas cobertas, mais uma história.. Meu amigo, meu sol, meu ar, meu pai. Se ele me deixasse, eu esvaziaria feito balão que voa ao vento, eu não seria, não existiria. E durmo em paz. Amanhã (ou será hoje?) ele vem de novo. Ele sempre vem. Será que vai querer café?

E se... o céu for aquele lugar secreto de dentro do nosso coração, pra onde sempre queremos voltar, mesmo sem nunca ter estado lá?




quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Escravidão na atualidade

Fiquei chocada hoje. Devo ser muito tapada. Há algumas semanas já tinha me indignado com as denúncias contra redes varejistas de roupas, como a Zara, que tem seus produtos feitos às custas de mão de obra escrava.
Assistindo ao Infowars, do jornalista Alex Jones, ele denuncia: Mais de 20 milhões de pessoas no mundo estão debaixo da monstruosa opressão escravagista. Não se engane: não são pessoas trabalhando por um salário de miséria. São verdadeiros escravos, na acepção mais medieval da palavra, presos pro dívidas, amarrados e mantidos sob a mira de armas de fogo. Servem como escravos sexuais, servem em lavouras, em fábricas clandestinas, ou por se negarem a seguir a fé de seus opressores.
Há hoje mais escravos no mundo do que em toda a história da humanidade!
À medida que os governos mundiais vão enfraquecendo, vendendo-se aos interesses das grandes corporações, essas vão se tornando o verdadeiro capataz, o dono da fazenda, o senhor feudal. E nós vamos comendo na mão deles, impotentes, cegos e dominados. Nós ainda somos escravos de luxo, aos quais se concedem pequenos privilégios. Mas imagino que não por muito tempo, já que as leis trabalhistas estão sendo minadas pelos quatro cantos do planeta. Combater a escravidão era parte das propostas de Obama durante sua campanha. Sim, há escravidão também na América.
Um chinês bem sucedido num evento em São Paulo, direcionado a empresários, soltou que o Brasil não vai crescer tanto quanto a China porque ainda se preocupa demais com os pobres. Ainda não se rendeu ao "crescimento a qualquer custo".
São cenas para as quais não há adjetivos. Palavras são impotentes pra expressar a dor dessas crianças e adultos despojados de toda dignidade.
Mas o que eu posso fazer? Me sinto uma idiota só em escrever isso aqui. O máximo seria me negar a comprar numa rede dessas, parar de consumir produtos de origem duvidosa, orar por esses coitados.
 Mas parece tão pequeno... sigo aqui nessa vidinha confortável, sonhando com luxinhos bestas. Quando comento com as pessoas, ouço que "ah, é isso mesmo, não é só a Zara não, se boicotarmos nem teremos mais opções..."
Esperamos ver notícias onde as empresas comprovem ser inocentes, de que a culpa era dos terceirizados, apenas para aplacar nossa consciência.  Queremos que alguém nos diga que está tudo bem, ou então, desligamos a tv porque essas situações nos incomodam, apontam o dedo pra nossa inércia.

O que mais podemos fazer???



http://www.infoplease.com/spot/slavery1.html

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Abrolhosssss, povo!


"Lippmann, Bernays e Lasswell declararam que o público não é apto a decidir seu próprio destino, que é o objetivo inerente à democracia. Ao invés disso, pediu por uma criptocracia, um governo oculto, uma classe líder a cargo da "manada desorientada". Como suas idéias continuam a ser aplicadas à sociedade,  é cada vez mais claro que uma população ignorante não é um obstáculo com o qual os governantes precisam lidar: isso é DESEJÁVEL, e na verdade, necessário a fim de assegurar a liderança absoluta. Uma população ignorante desconhece seus direitos, não busca grande entendimento e não questiona as autoridades. Simplesmente segue as tendências. A cultura popular cria e nutre a ignorância provendo entretenimento burro e apontando celebridades degeneradas  para serem idolatradas. Muitos me perguntam: "Existe uma maneira de parar com isso? " - Sim, há. PARE DE COMPRAR ESSE LIXO E LEIA UM LIVRO.
"Se uma nação deseja ser ignorante e livre, deseja o que nunca foi e jamais será." (Thomas Jefferson)


Lippmann, Bernays and Lasswell have all declared that the public are not fit to decide their own fate, which is the inherent goal of democracy. Instead, they called for a cryptocracy, a hidden government, a ruling class in charge of the “bewildered herd.” As their ideas continue to be applied to society, it is increasingly apparent that an ignorant population is not an obstacle that the rulers must deal with: It is something that is DESIRABLE and, indeed, necessary, to insure total leadership. An ignorant population does not know its rights, does not seek a greater understanding of issues and does not question authorities. It simply follows trends. Popular culture caters to and nurtures ignorance by continually serving up brain-numbing entertainment and spotlighting degenerate celebrities to be idolized. Many people ask me: “Is there a way to stop this?” Yes, there is. STOP BUYING THEIR CRAP AND READ A BOOK.
“If a nation expects to be ignorant and free, it expects what never was and never will be.”
- Thomas Jefferson
 Tradução de Sheila Boldt
Será que o gado abre o olho?

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Repassando Paulo Brabo

Acabei de ler. Essa tenho que passar adiante. Tah lá, no Bacia das Almas. Aliás, todo evangélico (quá) tem que ler. Se você consegue se desvencilhar da tortura mental que é a promessa da existência de um inferno, libere sua alma protestante e mergulhe na boa nova...
http://www.baciadasalmas.com/2011/a-sonegacao-da-graca/
Aqui o link direto para os capítulos sonegados, nas palavras do Brabo, do Paul Tournier: http://www.scribd.com/fullscreen/60945265?access_key=key-3fw4bfb07yahjpfg0hk

Deleite-se!

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Um dia eu chego lá

Tenho visto Jesus por aí. Não na boca dos cultos e sábios. Eles me dizem que estão chegando à verdade. Mas a verdade é tão cara, preciosa e experta que os humildes não podem chegar a ela. Ela fica limitada aos círculos fechados dos que lêem os autores russos, alemães ( é bom que não sejam americanos), mestrados e calejados na Teologia. Aliás, eles fazem teologia ( não me incluo porque infelizmente não cheguei a esse nível ainda).
Tenho visto Jesus por aí. Esfregado na minha cara de pau e nos olhos cansados pelos livros. Mas não o encontrei na vaidade das letras. Aliás, estou bem longe dos círculos letrados. Não por não desejar fazer parte deles, tenho que ser honesta, mas por não ter bebido nas fontes certas e muito, muito provavelmente, porque minha alma loira não tem sustância suficiente pra obter bilhete de entrada.
Mas enfim, voltando a Jesus, quando comecei a escrever este texto, estava bem indignadinha. Querendo meter o pau nessa cambada de gente que pensa que "estuda Deus". E pior, que descobre as verdades sobre Ele. Quem eles pensam que são? Quanta falácia, quanta arrogância...
Na verdade, minha máscara precisa cair. Andei me perguntando POR QUE cargas d'água EU ando lendo livros do Bonhoeffer, ou Lewis, ou Tolstói, fazendo uma salada sem fim. Até aprendi um cadinho, mas o que me motiva? Aonde quero chegar? Pouca sede de Deus, muita sede de reconhecimento. E isso é uma confissão. Talvez eu seja curada.
Quando visitei o Seu Paulinho, homem do básico das letras, mestre em hortas, 85 anos no cargo de conservador das obras de arte de Deus, tive que me recolher à minha insignificância, crua e estúpida como ela realmente é. Tem a audácia de dizer que Jesus é amigo dele, que anda com ele lado a lado na horta.  Esse homem tem a falta de inteligência de acreditar em tudo que lê na Bíblia, e pior, dizer que ela é a Palavra de Deus. Tem a capacidade de gastar o que lhe resta dos olhos tomados pela catarata naquelas letras questionáveis, e dizer incessantemente que delas flui vida. Ainda por cima, católico.
Ah, se o seu Paulinho pudesse ler os livros que os caras lêem, lista bibliográfica pela qual eu mataria... 
Oh alma poia! Como é difícil pra mim entender que Jesus anda na boca dos humildes, na roda de ciranda, nas perguntas das crianças. Como é difícil pra mim crer Nele sem explicação, sem teologias e religiões, sem vaidades. Como é difícil pra mim experimentá-lo, porque "minha vida de fé não pode se basear nas emoções".
Vou ler mais um pouquinho... quem sabe eu chego lá...

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Hoje, de novo

Mal abri meus olhos, já com saudades da cama, recebi um cutucão abusado do Hoje:
- E aí? - me pergunta animado.
- E aí o quê? - respondo cansada.
- Que vamos fazer hoje?
- Ah, sei lá... dar aulas, cuidar das crianças... Ihhh, deixa eu descer pra fazer o café que tá na hora!
- Tá, mas... que vai ser hoje?
- Como assim!? O de sempre!
Hoje fica meio amuado. Demora pra engrenar, contrariado e fazendo bico.
- Que foi? Por que tá emburrado? - pergunto meio de saco cheio.
- Ah, pô, levei uma eternidade pra acontecer, à meia-noite já passo o bastão pro amanhã, e tu me diz que vai ser o de sempre???